quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Essa jornada é minha

        

Tenho escrito a você ao longo dos dias como quem escreve um diário de bordo, se aventurando na esperança de guardar memórias, enquanto deseja voltar pra casa. Não há que eu moro, mas a que mora em mim. Ou como quem envia cartas a um parente distante ou um amigo de infância, contando detalhes do dia, na tentativa de preservar a intimidade. Tenho escrito para dar vazão aquilo que não dava conta sozinha, que me acompanha por ora nessa trajetória que, sabemos, logo não deve durar. Nem pra mim nem pra ti. Mas há de se ter cumprido seu papel.
Hoje decidi arriscar os primeiros passos sozinha. Calcei sapatos e me pus a caminhar, porque é pra frente que se anda...sempre.  E eu precisava cair pra seguir adiante, sem ser amparada. Hoje a verdade, ao invés de me derrotar por vez, me trouxe à luz da convicção de que existem jornadas que são só nossas. Precisamos cruzar bosques, vales, oceanos. Enfrentar dragões, bichos do armário, homens do saco, moinhos de vento. Solidão. Porque não existe desilusão maior que o passo nem frustração maior que o desejo de ir em frente.
No meu pequeno trajeto observei animais, crianças, jovens, velhos. Cada um a seu tempo. À sua pressa. À sua sede de viver. Pude ver de perto aquilo que a gente não nota, porque perdemos muito tempo voltando os olhos apenas pra nós mesmos, para os nossos anseios. Mais do vi, enxerguei. E pude observar que a vida segue seu curso e que por isso devemos seguir adiante.

terça-feira, 31 de maio de 2016

Sobre o que é diário

Nunca tive diário. Nem quando criança. Sempre achei uma ideia meio estúpida, sem sentido. Mas ontem, em meio a mais de 90 mil títulos de uma feira literária, achei um: pequeno, dourado, intrigante. Ele me propôs uma experiência nova. 365 perguntas; 1825 respostas. Uma para cada dia do ano, durante cinco movimentos de translação. Nem as seis horas extras anuais da Terra foram esquecidas. O diário tem o dia 29 de fevereiro que, pra mim, este ano, foi um divisor de águas. Pois bem, quando acabá-lo, estarei a quatro meses de completar 40 anos. Certamente terei respostas diferentes às mesmas perguntas. Como tenho tido ao longo desses 34 anos. Mas esses pedaços de folhas envelhecidas industrialmente e encadernadas me levarão a outra experiência. Melhor. A de dividi-la com alguém. Comecei a respondê-lo e o abandonarei em dois anos. Doarei, na verdade. E receberei daqui a quatro anos das mãos da pessoa que topou viver essa experiência comigo. Não sei como será. Se ele será mesmo preenchido ou negligenciado com o passar dos dias, dos anos. Mas o que sabemos sobre o amanhã? Talvez estejamos em lugares diferentes, como agora. Talvez em momentos diferentes de nossas vidas, como sempre. Talvez nem estejamos com vida. Talvez essa seja uma ideia tola...talvez! Sobre todas as perguntas que temos feito a nós no tempo em que nos conhecemos, respostas diferentes. Que foram caladas ou divididas. Esquecidas. Que amadureceram ou perderam o sentido. Porque a vida é assim, porque nós somos assim: mutantes.

domingo, 15 de maio de 2016

Rejeição





Escolher não é fácil. Toda decisão requer renúncia. E sair da zona de conforto é duro, mas as vezes é a melhor escolha.
Mas, e quando somos nós os abdicados? Definitivamente, não fomos preparados para rejeição! Fere nosso ego. Mexe com nosso brio. Mas até na decisão do outro temos escolhas a fazer: ou nos vitimizamos ou fazemos uma auto-análise de que podemos ter contribuído, sim, pra essa situação. Mas sem martírio. O que está feito está feito. Até no caos temos saída. Então, escolha se retirar com dignidade.

terça-feira, 1 de março de 2016

Nosso cardápio de emoções





Todos nós, dotados de inteligência e um pouco de autoconhecimento, sabemos no fundo até onde podemos ir, do que somos capazes.
Se as opções fossem-nos colocadas num cardápio de emoções, saberíamos escolher e descartar o insosso, onde falta açúcar ou pimenta. Sabemos exatamente o que nos sacia, o que nos dá prazer.
Aprendemos que comida saudável faz bem, mas inúmeras vezes optamos pelo fast food. Afinal, tem o paladar mais agradável e nos ludibria as sensações. Queremos comer com olhos e olfato, antes. Por fim, damos a primeira abocanhada. E em doses homeopáticas, vamos entupindo nossas artérias até chegarmos ao ponto do sufocamento. Com medo de morrer num infarto fulminante, mudamos radicalmente de hábitos. Queremos uma nova chance! Como se num estalar de dedos, nossa razão fosse lustrada por um limpador de para-brisas. Passamos a comer melhor, respirar melhor, ir a novos lugares, praticar exercícios, se dar a chance de reencontrar quem nos faz bem e esteve sempre disponível, conhecer novas pessoas, viver com mais qualidade. Perdemos peso, mudamos o corte de cabelo, damos um up no guarda roupa, às vezes mudamos até de endereço pra tentar caber no novo. Mas por que agora, se estava tudo ali antes da quase morte? Por que precisamos nos abandonar primeiro pra depois decidir tomar conta de nossas vidas? Por que temos dificuldade em dizer "não", ao outro e a nós mesmos? "Não" ao que temos a plena consciência que está nos chagando? Da possibilidade de rejeitar tudo aquilo que nos maltrata a saúde física e emocional?
Com o passar do tempo, esse cardápio de emoções fica até repetitivo. São sabores que nossos paladares reconhecem, no entanto temos preguiça de ir pra casa cozinhar, inventar uma nova receita, degustá-la, arrumar a cama e deitar tendo apenas o prazer de estar em nossa companhia. Temos apego a tudo e a todos. Somos acomodados, materialistas. Tememos o novo por pura preguiça e pavor do recomeço, mesmo depois de provar os mesmos gostos. Optamos por aceitá-los amistosamente. Nos são familiar. Correr o risco, pra quê? São tantos receios, que vamos nos esquecendo de nós mesmos, entregando e exigindo do outro um papel que só a nós cabe: o nosso compromisso com a felicidade.