terça-feira, 22 de junho de 2010

Resta



"Se io non posso parlare
Ora che sei con me
E' forse un modo di osare
Dimmi tu che cos'e'
Tu che raccogli il mio cuore senza far rumore
Da questo lato del fiume
Ogni cosa e' piu' facile
Le mani scorrono libere
Su di te che respiri le pause della mia canzone
Resta resta resta
Ora che scrivo il tuo nome
Sull'acqua del fiume
Passa tutto passa
Ma tu non sei una primavera, non sei una sera,
Se apro gli occhi e ti trovo ancora
Ancora".
(Chiara Civello)

segunda-feira, 21 de junho de 2010

A arte de perder









A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas coisas contêm em si o acidente
De perdê-las, que perder não é nada sério. Perca um pouquinho a cada dia. 
Aceite, austero, a chave perdida, a hora gasta bestamente. 
A arte de perder não é nenhum mistério. 
Depois perca mais rápido, com mais critério: 
Lugares, nomes, a escala subseqüente da viagem não feita.
Nada disso é sério. 
Perdi o relógio de mamãe. 
Ah! E nem quero lembrar a perda de três casas excelentes. 
A arte de perder não é nenhum mistério. 
Perdi duas cidades lindas. 
E um império que era meu, dois rios, e mais um continente. 
Tenho saudade deles. 
Mas não é nada sério.
– Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo que eu amo) não muda nada. 
Pois é evidente que a arte de perder não chega a ser mistério por muito
que pareça (escreve!) muito sério.
(Elisabeth Boshop)

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Ponte miocárdia



Um elevado no caminho
Das arteriais sinuosas no meu coração...
Chegou a hora da travessia.

terça-feira, 8 de junho de 2010

Desatino, desfaço

Desato a nós
Amarrados no ato
insensato
Do passo mal dado
no pó

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Tantas


Muitas de mim se lapidaram em pedra.
Bruta, rígida, inatingível.
Do meu solo também se esculpiram joias. Raras.
Já perdi as formas de como esta mulher em mim sobrevive.
Delicada e carbono.

Ao mestre, com carinho

Hoje faz um ano que perdi um grande amigo. Por isso decidi publicar novamente este post que escrevi em sua homenagem.



Quem mora em Belém certamente sabe ou já ouviu falar em Walter Bandeira. Cantor, locutor, ator, pintor, professor e piadista. No auge da sua irreverência e carisma, Walter se foi de repente, deixando com lágrimas nos olhos e aperto no coração os artistas paraenses, família, amigos e fãs da boa arte.
Eu tive a oportunidade de conviver com o Jão durante oito anos. Todas às terças-feiras (às vezes, quartas) nos encontrávamos para a gravação do Minuto da Universidade. Lembro que, durante esse período, fui única vez a um show dele. Rei dos palcos, prefiro o Walter dos bastidores. Tenho o CD solitário lançado (nosso Frank Sinatra papachibé), mas fiquei mais triste quando a Drika roeu meu segundo celular, pifando com ele a gravação de “ne me quitte pas” que ele tinha gravado só pra mim. Em minha memória, um arsenal de lembranças do homem de camiseta furada que lia revistas velhas dentro do UFPA Padre Eutíquio. Recordo-me daquela época em que nos espremíamos na copa da Academia Amazônia, comendo pastelzinho frito do tio do lanche com o café preto da dona Bené, enquanto repassávamos o texto e ele me dava aulas de interpretação. Dizia, sempre: “com essa voz bonita, você tá perdendo dinheiro”. Não Walter, meu talento é outro.
Lembro dele me prendendo nas portas, falando dos seus “clientes”, do salário parco, das aquarelas, das notícias em alta e de trivialidades. Dele, me recordo ligando todo início de mês pra saber se a bolsa já tinha caído. Quando caiu e quebrou a perna, íamos (cinegrafista, auxiliar e eu) à sua casa para que gravasse na câmera Betacam. Ele aparecia na sala de cueca sendo empurrado em uma cadeira de escritório. Um dia resolveu facilitar nossas vidas. Entrou na internet, baixou um programa de edição de áudio, adaptou um estúdio no próprio quarto, onde recebia os textos, gravava e os enviava onlinemente.
Hoje acordei com saudade. A culpa é da Nara, que me perturba quase todo dia. Tira sarro da minha cara, junto com o Bargas, depois aperta minhas bochechas e braços dizendo que só o faz porque me ama. Ela, espírita convicta, diz “acho que tio Walter fica do meu lado, me atentando. Só pode. Eu não era assim (irreverente), mas estou desde quando ele morreu”. Que bom, Nara! Você está mais leve, apesar da gravidez...
No último ano em que trabalhamos juntos, pouco antes de pedir demissão e nos afastarmos do convívio semanal, ele escreveu numa folha em branco do computador que eu usava:
"amargo em lâminas nos detalhes do teu corpo ausente. como presença fora e de tal forma afinada com os meus desejos que gostaria duvidar, sair desse tormento quase verdadeiro".
Decidi postá-lo aqui em sua homenagem. Sem edições. Do jeitinho que escreveste e eu salvei. Até qualquer dia, amigo!
(Ilustração J. Bosco - Jornal O Liberal)


P.S: A Nara, sobrinha de Walter, a que me refiro no texto, deu à luz ontem ao Bernardo. Ainda me impressiono com os ciclos da vida!